Rachel Duarte
Na próxima quarta-feira (16), passa a vigorar a Lei de Acesso à
Informação no Brasil, que obriga aos órgãos públicos a fornecer qualquer
informação solicitada pelos cidadãos. A nova norma exigirá a
digitalização dos dados, o que será um grande desafio para um Brasil
ainda não totalmente informatizado e com dificuldades de acesso à
internet. Em seminário sobre o Marco Civil da Internet, promovido pela
Câmara Federal nesta quinta-feira (10), na Assembleia Legislativa do Rio
Grande do Sul, a secretária nacional de Inclusão Digital, Lygia Pupatto
falou que “não caiu à ficha dos órgãos governamentais de que serão
obrigados a fornecer qualquer dado solicitado pelos cidadãos”.
Ela recordou que ainda há lugares do Brasil que ainda não tem sequer
computador nas administrações públicas. “Nas nossas conversas estamos
alertando os prefeitos para a digitalização dos dados. Com o projeto das
Cidades Digitais vamos auxiliar as cidades com softwares para
digitalização dos dados financeiros, tributários, de saúde e educação.
Vamos capacitar os servidores para esta cultura e construir alguns
centros digitais regionais”, explicou.
De acordo com a representante do Ministério das Comunicações, aos
municípios não contemplados com o Cidades Digitais, será disponibilizado
uma fonte de financiamento pelo BNDES. “Nós não temos mais como fugir
deste processo de evolução digital. Não há retorno. Só caminha para mais
avanços”, afirmou. Lygia falou que o governo federal também está
elaborando um Plano de Acessibilidade para as pessoas portadoras de
deficiência conseguirem acessar a internet. “Temos 98% dos municípios
com telecentros, que são obrigados a utilizar o software livre”,
complementou, falando sobre as políticas de inclusão digital da União.
Presente à audiência, um dos coordenadores do Gabinete Digital do
governo gaúcho, Éverton Rodrigues, disse que no executivo estadual a
política interna é a utilização da mesma ferramenta de domínio público.
“Usamos a tecnologia livre porque partimos do princípio que estamos em
um órgão público e utilizando recursos públicos na nossa atividade”,
justificou.
Rodrigues foi um dos palestrantes a abordar o eixo sobre o Poder
Público do texto do Marco Civil da Internet. Ele concordou com os
artigos da lei, mas, fez algumas observações. “Fomentar o uso da língua
portuguesa na produção de conteúdos na web”, citou. O coordenador gaúcho
informou que o executivo estadual trabalha na adequação à Lei de Acesso
à Informação. “Os dados tem que ser disponibilizados de forma digital,
senão encarecerá o serviço público. Precisaremos de mais servidores para
dar conta da disponibilização das informações caso ela seja feita de
forma analógica”, comparou.
O representante da Central de Serviços do governo federal, Serpro,
José Maria, disse que a empresa pública já está adequada às exigências
da nova Lei de Acesso à Informação e em consonância com os termos do
Marco Civil da Internet, ainda não aprovado pelo Congresso Nacional. “O
Marco diz que tem ter padrões de dados abertos. O governo eletrônico da
União já faz isso. O importante é percebermos que não basta abrir os
dados, que tem que abrir com contexto, para que possamos cruzá-los”,
alertou.
Acesso e regulação da internet
Além da relação da regulação da internet e a Lei de Acesso à
Informação, outros aspectos importantes relacionados ao uso da rede
foram debatidos no seminário do Marco Civil. Entre eles, a neutralidade
da rede, para que todos os cidadãos possam acessar a internet em
condições iguais no país, sem privilégios.
Foto: Eduardo Quadros
Sobre este ponto, o presidente da Associação Brasileira de Centros de
Inclusão Digital, Mário Brandão comparou a neutralidade com o princípio
da dignidade humana. “Se basta como princípio. Não carece, portanto, de
regulamentação”, falou, sobre a necessidade de revisão de uma palavra
do texto do Marco Civil que deixa lacunas sobre esta compreensão. Na
visão de Brandão, que falou representando 30 milhões de brasileiros que
só conhecem internet devido aos estabelecimentos comerciais que vendem
acesso (lan houses, cybercafé, etc), a desburocratização é o principal
entrave do desenvolvimento brasileiro. “Se preocupam muito com a
transparência na hora da criação das leis e políticas públicas, mas a
desburocratização também é vital. É inadmissível seguir multando lan
houses que conseguem bravamente chegar a pontos que nem os governos
chegam”, afirmou.
O mercado de lan houses é a garantia de 40% do acesso à internet no
Brasil. Segundo dados apresentados pela Associação, 67% das classes D e E
só conhece a rede devido à existência destes estabelecimentos. Brandão
crítica a falta de incentivo ao empreendedorismo na rede. “Não consigo
achar uma iniciativa governamental neste sentido, relacionada à
internet. O comércio na internet é enorme e variado. Se não há uma visão
positiva sobre os microempresários, não alcançaremos o avanço que o
poder da internet permite”, criticou.
A secretária nacional de Inclusão Digital, Lygia Pupatto, defendeu a
boa vontade do governo federal em buscar soluções para o desafio da
democratização da internet e no acesso qualificado. “Estamos atentos a
tudo isso e monitorando o crescimento digital no Ministério das
Comunicações. Aceitamos a parceria das lan houses, não somos inimigos
aqui”, defendeu. Segundo a representante do governo, “está sendo
licitado a faixa de 400 Mhz para alcançar a zona rural”, que tem
irrisórios 0,6% de computadores com conexão de internet no país. Lygia
ressaltou que o processo licitatório priorizará o preço mais baixo para o
usuário e não para os custos do governo. “E ainda vamos exigir a
garantia de acesso por esta empresa de internet nas escolas rurais”,
falou.
A secretária alertou que “quanto maior o acesso, maior a necessidade
de regulação”, o que torna o debate sobre o Marco Civil do Congresso
Nacional fundamental para complementação do trabalho feito pelo
executivo federal. “Precisamos regular tudo isso para não comprometer
inclusive a liberdade da internet com o mercado da informação. O acesso
por celular também está crescendo muito, é outro que teremos que pensar
uma regulação”, defendeu.
Audiência foi a primeira fora do Congresso Nacional
A realização do debate sobre Marco Civil na Internet em Porto Alegre
foi capitaneada pela deputada federal Manuela D’Ávila (PCdoB-RS), que é
vice-coordenadora da comissão especial que analisa o projeto de lei
sobre o tema (PL 2126/11) na Câmara Federal. A reunião foi a primeira da
comissão fora do Congresso Nacional e debateu também a guarda de logs e
privacidade dos usuários. “O Brasil é o primeiro país a pensar uma
legislação de direitos para usuários de internet”, recordou Manuela.
O relator da proposta, deputado Alessandro Molon (PT-RJ), informou
que o ciclo de debates seguirá por mais seis estados e ao final, um
parecer será emitido pela Comissão. “Queremos regras que protejam a
liberdade da internet. Mas, precisaremos de regras. É ilusão o mito de
que a ausência de regras é que faz a liberdade da rede, podemos
colocá-la em risco se não tivermos um marco regulatório”, defendeu.
O projeto do Marco Civil da Internet foi organizado pelo Ministério
da Justiça em parceria com a Fundação Getúlio Vargas e passou por duas
consultas públicas em 2009 e 2010.
Fonte:
http://sul21.com.br/jornal/2012/05/secretaria-diz-que-nao-caiu-a-ficha-de-governos-sobre-lei-de-acesso-a-informacao/?utm_medium=twitter&utm_source=twitterfeed