Diante
da inexplicável ausência (gap) de uma Política Pública de Arquivos e de
gestão documental: “o tempo ruge”, as pragas danosas do descaso e do
tempo vão dilapidando o patrimônio documental e memorial. Salve se quem
puder do esquecimento!
Você já ouviu falar no “poder dos arquivos”? Tem um texto que explica: The Power of Archives: Archivists’ Values and Value in the Post-Modern Age.
Há
21 anos, A lei federal que dispõe “sobre a política nacional de
arquivos públicos e privados” já existe. O CONARQ foi criado através
dela, com a missão de definir políticas públicas de arquivos, diz o artigo 26 da Lei nº 8.159, de 8 de janeiro de 1991:
“Fica criado o Conselho Nacional de
Arquivos – CONARQ, órgão vinculado ao Arquivo Nacional, que definirá a
política nacional de arquivos, (…)”
Por que
então, ainda não temos uma política pública de arquivos? Na verdade,
precisamos ser justos, existem órgãos do judiciário, como a Justiça
Federal e o TJ do RJ que tem uma política de arquivos efetiva, que
deveria entrar para o rol das melhores práticas! O TJ/RJ inclusive tem
um Departamento de Gestão do Conhecimento, ao qual estão ligados os
serviços de arquivo e todos os serviços de informação estão integrados! É
uma ilha de excelência num oceano informacional complexo, que é carente
de política públicas efetivas, transparentes e dinâmicas!
Na Justiça
Federal, o Conselho da Justiça Federal (CJF), já exarou uma série de
portarias que definem sua política de Gestão Documental, inclusive
definindo critérios objetivos para aqueles processos que podem ser
descartados. Qual o segredo de terem chegado a definição de uma política
pública e institucional de arquivos e sua implantação gradual mas
efetiva e dinâmica? Uma pesquisa talvez respondesse com maior
propriedade. Foi o resultado de um processo de construção coletiva e
colaborativa, multidisciplinar, que ouviu magistrados, operadores de
direito, arquivistas, historiadores e demais atores sociais. Noutras
palavras uma relação dialógica – não só saber falar, mas também saber
ouvir os seus pares!
O que
escrevi acima foi resultado de uma pesquisa que resultou numa monográfia
apresentada na cadeira de Políticas de Arquivos no curso de
Arquivologia da Fabico/UFRGS.
Quanto à 1ª
CNARQ – Conferência Nacional de Arquivos, acho válido! Mas se você
acessar o portal da AAERJ e após votar em qual sua opinião em relação
aos desdobramentos do CNARQ, verificar como está a pesquisa de opinião,
verá que o resultado está assim: Otimista= 14%; Cética= 86%; Pessimista=
0%. Vote e confira…
Tomo
a liberdade de dar minha opinião quanto ao CNARQ: embora compreenda o
contexto em que está inserido o CNARQ e o fato relevante de ser um
processo de construção, coletiva e colaborativa, dos profissionais de
arquivo e de todos os que estão preocupados com a questão do patrimônio
documental e arquivístico brasileiro, minha preocupação é só uma:
estamos atrasados e defasados a mais de 2 décadas na definição de
políticas de arquivos efetivas.
De outra
parte, cabe ao Poder Público e aos seus gestores que tenham a
consciência social de seu dever constitucional de levar a efeito a
Gestão Documental:
“Art. 1º – É
dever do Poder Público a gestão documental e a proteção especial a
documentos de arquivo, como instrumento de apoio à administração, à
cultura, ao desenvolvimento científico e como elementos de prova e de
informação.“
“Art. 23 – É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios: III - proteger os documentos, (…)
Cabe citar a
Carta Magna, no seu art. 216, que incluem como elemento integrante do
patrimônio cultural brasileiro, dentre os vários itens bem conhecidos,
lista como formadores da memória de diferentes grupos formadores da
sociedade brasileira: § IV – as obras, objetos, documentos, (…)
Por que
então, simplesmente não se prima por aplicar as leis que já existem e
que foram o resultado de toda uma dinâmica legislativa democrática em
relação ao patrimônio documental brasileiro?
Por que o
PRONAME – Programa Nacional de Gestão Documental e Memória do Poder
Judiciário , um esforço profissional e altamente qualificado do CNJ, que
chegou ao primor de elaborar tabelas de temporalidade para diferentes
órgãos do poder judiciário – elaborado por um grupo de especialistas
altamente gabaritados – entretanto parece que, simplesmente, está
encontrando dificuldade em ser implementado?
Bem, retomo a minha preocupação: estamos atrasados no tempo, no que tange a Gestão
Documental, com raríssimas exceções de tribunais como o do RJ, de BSB, e
a JF. O CNJ recomendou, e, alguns Conselhos já corroboraram: precisamos integrar arquivistas aos nossos quadros. Mas quantos e quando? À exceção do TRF da 2ª Região e TRT MG, poucos já atenderam a esta sugestão.
O problema do atraso é proporcional à não
prioridade a Gestão Documental. Ela só vem à tona quando se esbarra no
problema da alta demanda de espaço físico e seus altos custos
operacionais. O que é está por trás desta não priorização? No meu entender é uma questão de falta de consciência e responsabilidade social, para não dizer institucional.
A falta de
espaço físico para guardar tudo é uma mazela social e institucional dos
Arquivos a qual não podemos fechar os olhos! O TJ RS, por exemplo,
noticiou que chegou a 4 milhões de processos. O seu mega prédio do
Arquivo Judicial do Estado está com sua capacidade completamente
esgotada! Entra ano, sai ano e por mais que já exista profissionais
arquivista de alta competência, que estão trabalhando duro, a
problemática extrapola o âmbito institucional. Neste ponto, foi louvável
a iniciativa de criar um Grupo Multidisciplinar para tratar da questão
de chegar a um consenso do que pode ser descartado – como por exemplo as
multicópias. Leia: TJRS discute com especialistas o descarte de processos do Arquivo Judicial do Estado
Essa
iniciativa democrática, aberta, transparente e inovadora do TJRS merece o
aplauso de toda a sociedade além do reconhecimento por parte da classe
dos arquivistas pelo primor e sensibilidade como a questão está sendo
tratada.
DECLARAÇÃO UNIVERSAL SOBRE OS ARQUIVOS *
Arquivos registram decisões, ações e
memórias. Arquivos são um património [patrimônio] único e insubstituível
transmitido de uma geração a outra. Documentos de arquivo são geridos
desde a criação para preservar seu valor e significado. Arquivos são
fontes confiáveis de informação para ações administrativas responsáveis e
transparentes. Desempenham um papel essencial no desenvolvimento das
sociedades ao contribuir para a constituição e salvaguarda da memória
individual e coletiva. O livre acesso aos arquivos
enriquece o conhecimento sobre a sociedade humana, promove a democracia,
protege os direitos dos cidadãos e aumenta a qualidade de vida.
Por isso reconhecemos:
# o caráter singular dos arquivos como
evidência autêntica das atividades administrativas, culturais e
intelectuais e como um reflexo da evolução das sociedades;
# o caráter fundamental dos arquivos no apoio à condução eficiente, responsável e
transparente de negócios, proteção dos direitos dos cidadãos, fundamentação da
memória individual e coletiva, compreensão do passado, documentação do presente e
orientação das ações futuras;
# a diversidade dos arquivos ao registrarem todas as áreas da atividade humana;
a multiplicidade de suportes e formatos em que os documentos são produzidos,
incluindo papel, audiovisual, digital e outros;
# o papel dos arquivistas,
profissionais qualificados, com formação apropriada e contínua, que
servem as suas sociedades, apoiando a produção, seleção e conservação
dos documentos, e os tornam disponíveis para uso;
# a
responsabilidade de todos, cidadãos, gestores e autoridades públicas,
proprietários ou detentores de arquivos públicos ou privados,
arquivistas e outros profissionais do campo da informação, na gestão de
arquivos. (grifo do arquivista blogueiro)
Por isso nos comprometemos a trabalhar juntos, para que:
# sejam adotadas e aplicadas nacionalmente políticas e legislação arquivística adequadas;
a gestão de arquivos seja valorizada e
realizada com competência por todos os organismos, públicos ou privados,
que produzem e usam documentos de arquivo na condução de seus negócios;
# sejam disponibilizados os recursos necessários para apoiar a adequada gestão dos
arquivos, inclusive a contratação de profissionais capacitados;
# os arquivos sejam geridos e conservados de forma a garantir a sua autenticidade,
confiabilidade, integridade e uso;
# os arquivos sejam acessíveis a todos, respeitando a legislação pertinente e os direitos
dos indivíduos, produtores, proprietários e usuários;
# os arquivos sejam utilizados de modo a contribuir para a promoção de uma cidadania
responsável.
* Aprovada na assembléia geral do
Conselho Internacional de Arquivos realizada em 17 de setembro de 2010,
durante a 42ª CITRA, em Oslo. Tradução para o português acordada entre o
Arquivo Nacional (Brasil) e o Arquivo Nacional da Torre do Tombo
(Portugal).
Clique aqui para imprimir =>
uma versão oficial da DUA do ICA no Word
De
tudo o que vi sobre a CNARQ, não li alguma menção à DUA, e promover sua
difusão para ajudar na construção da consciência social e cidadã em
relação a relevância dos arquivos para a invenção da memória, a
interpretação social, o processo de compreensão da diversidade que forma
o mosaico cultural brasileiro e a valoração do patrimônio documental
arquivístico brasileiro – incluindo o patrimônio arquivístico digital!
Será que estou enganado? Não estaremos reinventando a roda? A lei de
acesso a informação entra em vigor em maio – e tem gente que se atreve a
dizer que ela não vai pegar? ISTO É QUE PRECISA MUDAR – uma questão de
atitude de amor à pátria e respeito às leis!!!!
Desculpem ter me delongado, é minha veia literária, acho que tenho que começar a escrever livros! eh eh eh
Depois de
toda esta reflexão, quase 20 anos de dedicação a um órgão público, sigo
aprendendo a cada dia na minha agradável e humilde rotina de trabalhar
no balcão – embora sendo bacharel em Arquivologia há 1 ano! A boa
notícia é que nutro a expectativa iluminada de uma nova oportunidade de
trabalhar num local promissor, interagir com colegas pesquisadores e
encontrar gestores sintonizados com a consciência social e institucional
da Gestão do Conhecimento à qual inclui a Gestão Documental, como um de
seus componentes primários e essencial! Recomendo um livro para
expandir o PODER DOS ARQUIVOS? Pode ser esse:
Fonte:
http://arquivistasocial.net/2012/02/08/gestao-documental-so-com-politica-publica-de-arquivos-transparente-e-o-controle-social/